22 de fevereiro de 2018

SUBINDO O OLIMPO TROPICAL (parte 1)


            Em meados de 2013, finalmente encerrava a trilogia Yeshuah. Não me recordo que período foi exatamente, mas provavelmente foi em meados do ano, junho ou julho. A melhor forma de recuperar o fôlego após treze anos concentrados sobre as quase quinhentas páginas que fizeram essa trilogia, era limpar a prancheta e começar a trabalhar em um novo projeto: fôlego eternamente renovado. Aquela deliciosa sensação de findar uma trajetória e o ineditismo de uma nova. André Diniz, roteirista e desenhista de mão cheia e de talento inigualável, e antes de tudo amigo de longuíssima data (isso para não entregar a idade de ambos), veio naquele bom e velho jeito sossegado e discreto de ser, propor-me essa nova obra a se trabalhar na minha prancheta limpa. A coisa vinha sem nome inicialmente, onde bem depois, numa mesa de padaria ao lado de sua casa aqui na Vila Mariana (hoje, Diniz mora em terras lusitanas), com ajuda de sua esposa Marcela, conseguimos parir o título: Olimpo Tropical.
André Diniz, roteirista 
             André Diniz, que me perdoem os outros amigos parceiros do texto, é provavelmente o que mais se encaixa com minha proposta de fazer quadrinhos. Explico: existem alguns elementos em suas histórias que me seduzem e muito complementam o que quero contar. Há coisas escondidas, sentimentos, guardados atrás de ações, movimentos de seus personagens. Sutilmente guardados, porém não escondidos para os melhores observadores perceberem. Pérolas não jogadas aos porcos, mas aguardando serem colhidas com a atenção e o coração de bons pescadores. Assim, havia sido em nossa primeira parceria numa obra autoral Subversivos: Companheiro Germano, lançado em 2000.Um marco de grande importância em minha carreira e divisor de águas na minha forma de desenhar e contar uma história.
Escadaria no Morro da Providência, em foto de
Maurício Hora, que foi um dos pontos de
inspiração para "Olimpo Tropical"
            Mas por que levamos tanto tempo para fazermos outro trabalho juntos? Primeiramente porque cada um teve e tem seus projetos solos, pessoais e outra, porque usando aquele velho bordão, o tempo sabe o que faz. André, como estava dizendo, veio me propor uma nova parceria em uma história sua inspirada em uma de suas muitas andanças pelo Morro da Providência , primeira favela carioca e localizada na região central da cidade. André nesse período estava fazendo a biografia de Maurício Hora, fotógrafo de prestígio internacional e morador desde que nasceu do referido Morro da Providência. Enfim, nas andanças pela favela para pegar depoimentos e imagens para compor a biografia desenhada do fotógrafo, topou com uma cena curiosíssima, para André pelo menos, não acostumado a isso, ao contrário dos moradores: um garoto, um menino, sentado no topo de uma escadaria imensa da favela, totalmente largado em uma cadeira, entediado, com uma metralhadora, acho, não me recordo agora o que me contou então. O garoto estava vigiando do topo da escadaria, caso algum grupo da polícia subisse para atacar o tráfico da favela. A visão daquele moleque com tédio de um cotidiano violento, sacudiu sua cabeça, foi um impacto. E qual a melhor forma de fazer esse sentimento criar seu caminho? Gerar uma história. Criar uma História em Quadrinhos. 
            Morro da Favela, a obra de André onde conta a biografia do fotógrafo Maurício Hora, havia sido lançada há alguns poucos anos antes e alcançado grande sucesso de público e crítica aqui no Brasil e começava a trilhar seu caminho fora do país, com publicação na França e Inglaterra (hoje já somam Portugal e Polônia, que me recordo), então, a intenção era justamente ter essa história do “menino entediado e sua arma” contada visualmente por outro desenhista. Esse desenhista seria eu.
           Na próxima postagem, continuarei contando um pouco mais do processo de criação deste meu mais recente lançamento, Olimpo Tropical.

2 comentários:

Chris Munhão disse...

Estou curioso pra conferir. Estive dando uma olhada numa resenha do livro e pude ver algumas páginas. Os desenhos estão maravilhosos, e o tema da história é atual, verdadeiro e muito interessante.

LAUDO FERREIRA disse...

Opa, Chris, obrigado pelo carinho. Realmente essa hq vem tendo um ótimo retorno da crítica e dos leitores no geral, tanto na edição brasileira, quanto portuguesa. Quer dizer, a gente só fica feliz.
Abração.