18 de julho de 2021

QUAL A CARA DO SEU PERSONAGEM? final

            Venho trazendo para vocês em minhas últimas postagens algumas dicas sobre possibilidades de expressões faciais para trabalharem em suas hq's. Mais uma vez digo que, dependendo da linha de desenho, a variedade extensa de expressões não seja tão importante assim, mas por via de regra, essas variações, como também já foi dito, podem enriquecer a narrativa e trazer um outro sabor para o roteiro e consequentemente para o leitor. O assunto é vasto, dariam várias postagens, mas há outras questões na produção de uma hq que quero ainda compartilhar com vocês.

           Mas para fecharmos essa questão, trago para vocês cenas de quatro clássicos do cinema, onde as imagens, as expressões falam além do texto. Claro que trata-se de mídias diferentes, cinema e quadrinhos, mas obviamente há um diálogo entre as duas desde sempre e que não é preciso tratá-lo aqui. Esses exemplos valem mais para observação de vocês e claro, assimilação e quem sabe, ajude nos futuros trabalhos.

           Casablanca, clássico absoluto de 1942, com Humphrey Bogart e Ingrid Bergman. Na cena, o personagem de Bogart, Ricky reencontra sua amada Ilsa, após ela o ter abandonado há alguns anos atrás. A cena acontece no bar de Ricky embalada pela música do casal tocada pelo pianista. Reparem a sutil expressão de Ricky/Bogart ao constatar que sua amada, que o magoou está presente em seu bar, expressão essa que pode suscitar muitas possibilidades dentro dos sentimentos do personagem.


              Era uma vez no oeste, obra máxima do diretor Sergio Leone, de 1968, com Henry Fonda, Claudia Cardinale e Charles Bronson. Aqui, a cena se desenrola numa estalagem no meio do deserto americano no velho Oeste. Um pistoleiro foragido entra no local deixando os presentes assustados, com exceção de um misterioso homem, nas sombras, tocando uma gaita (harmônica). O pistoleiro se aproxima e trava-se aí um diálogo entre os dois. A câmera nessa sequência está fixada praticamente no rosto dos personagens, um extreme-close-up  para salientar as emoções e o diálogo silencioso dos personagens.

            Rainha Cristina, outro clássico absoluto, filme de 1933 com a musa Greta Garbo. Aqui (desculpem pelo spoiler!) temos a sequência final onde Cristina, a própria Greta, decide abdicar de sua coroa, de seu reino, para partir de seu país, a Suécia, junto a seu amado, um aventureiro vindo da Espanha. Porém, nesse interim, o amante é assassinado por pessoas do reinado de Cristina, que mesmo vendo seu amor morto em seus braços, decide seguir adiante abandonando seu reino. Na última cena do filme, vemos Cristina na proa do navio que parte da Suécia, a câmera foca em seu rosto numa longa cena que enquanto encerra o filme, mostra o olhar congelado da diva Greta Garbo, mostrando mais uma vez várias possibilidades de emoções e, provavelmente um último segundo, creio, um sentimento de liberdade que tanto buscava, mesmo que sem seu amor ao seu lado.

            E por fim, uma das últimas cenas (desculpem por mais este spoiler!) de Blade Runner, clássico da ficção-científica de 1982, do diretor Ridley Scott com Harrison Ford e Hutger Hauer. Nesta sequência, o caçador de androides, Ricky Deckard (Ford) é salvo por sua caça, o androide Roy Batty (Hauer), que buscava durante o filme todo descobrir uma forma de prolonga sua existência. Vendo seu algoz temendo por sua própria vida, compreende a finitude da existência para todos. Num monólogo absoluto, Roy traz para Deckard um sentido de existência único para humanos e androides. Mais uma vez, os closes nos rostos dos personagens são fundamentais para realçar os sentimentos presentes, aqui, embalados por uma chuva que cai.
           
               "Que experiência viver com medo!" frase dita por Roy Batty a Rick Deckard enquanto o observa tentando sobreviver pendurado no alto de um prédio. Cena carregada de sentimentos profundos, filosóficos, porém, as imagens falam mais. Isso pode ser levado para os quadrinhos também. Basta aguçar sua sensibilidade como artista, como criador, mas óbvio, antes de tudo com ser humano, pois em nossa arte é disso que falamos, dos sentimentos, das experiências. 









            

                        

16 de julho de 2021

QUAL É A CARA DO SEU PERSONAGEM? pt. 02

 

            

           

            Há muito tempo os quadrinhos saíram de sua fonte, de sua linha básica de narrativa e expressividade imagética, acho até que se dispensa dizer isso, mas enfim, sempre é bom reiterar pois os desavisados, os desinformados estão sempre de plantão. No que se refere à criação do concept de um personagem, muito se evoluiu. Hoje em dia temos personagens riquíssimos em seus perfis psicológicos e que em alguns casos até, quando transpostos para outras mídias como no caso o cinema, muito comum hoje em dia, às vezes, essa transposição fica devendo para o personagem e sua versão original, os quadrinhos. Pois à vastidão que se criou tanto psicologicamente quanto cenicamente para esse personagem e seu universo nas hq’s , que numa adaptação para o cinema, em alguns casos, fica-se restrito aos conceitos originais.

            É importante dizer, e aqui falo mais diretamente com os desenhistas, que é fundamental estudar as formas que vai se trabalhar a expressão física dos personagens, como serão mostradas as emoções na face desses indivíduos ficcionais. Uma sugestão importante é estudar outras mídias, além dos quadrinhos em si:  cinema, teatro, dança, literatura, o que for possível. Entender como emoções são mostradas nessas outras formas de arte. Como em um filme e seu ator, o personagem em uma hq em sua expressão pode agregar outros sentimentos além daquele que se está mostrando no texto dentro do balão, ou em outros casos, uma expressão pode até dispensar textos, dando assim um peso dramático muito maior do que se buscava. O estudo de outras formas de arte pode propiciar um outro campo para sua criatividade na hora de produzir uma história em quadrinhos. Basta simplesmente você como aluno, como pesquisador, dar-se a liberdade para que esses novos elementos venham agregar e aí, essas informações irão se transformar em qualidades para sua arte.

            Pense, por exemplo, que um sorriso pode significar muita coisa, além dos sentimentos óbvios. Simples assim. Um olhar pode trazer infinitas possibilidades. Há que se travar um duelo mortal apenas com troca de olhares. Pense nisso. Como disse na postagem anterior, essas dicas podem funcionar tanto para o desenhista que também escreve seu roteiro como para o que vai trabalhar com roteiro de um escritor.

Sequência de "A história do ovo", às vezes a expressão no rosto do personagem pode dizer
mais que um balão de fala.



          Mas é claro, esse processo, se existe uma busca por ele, há que se entender que tudo leva tempo para aprimoramento e, consequentemente chegar a melhoras, uma maestria, embora a busca sempre irá acontecer, esqueça um pouco então, a tal “maestria” e concentre-se na busca. O processo é simples, é estudar essas outras artes dentro do que busca para sua. Olhar os outros campos e ver o que eles podem trazer de útil e bonito para o seu.

       Imagine seu personagem como ele será visualmente quando for criar seu concept, saia do lugar óbvio que tanto se fez e consequentemente se desgastou nos quadrinhos. Tipo físico. Rostos. Como ele se veste? Saia do seu guarda-roupa e do guarda roupa de seus conhecidos e imagine o mundo de seu personagem. Se for algo tão fora do seu dia a dia, aquela velha regra: pesquise. Esqueçam, os meninos, por exemplo, que uma garota sensual, precisa necessariamente se vestir de modo excessivamente provocante. Pode justamente ser o contrário. Há outras formas de se mostrar sensualidade. Isso é único exemplo, bem simples, pois as possibilidades são infinitas.

         


No topo deste texto, coloquei uma sequência de expressões que fiz testando algumas possibilidades. Para isso o uso de um espelho foi importante. 
Um outro ponto comentado que foi os figurinos, vale fazer uma boa pesquisa e criar uma pasta no seu computador com essas referências, daí, quando for trabalhar na hq é só procurar nela e, caso não ache aquilo que pensou, o universo da internet é vasto.

          Acho que ainda vale uma postagem a mais onde quero esmiuçar um pouco mais essa questão com vocês. Topam?