16 de março de 2018

TIANINHA E OS CAMINHOS PARA SUAS HISTÓRIAS

Capa da segunda revista da personagem

             Acredito que não exista uma regra de fato para se criar. Criar um roteiro. Muita gente tem seus métodos e nele mantém seu ritmo de criação constante. No caso hoje falo com vocês de roteiro de uma História em Quadrinhos, claro, ponto base deste blog. Para mim, sempre trabalhei das mais diversas formas possíveis e para que melhor entendam, darei alguns exemplos: a trilogia Yeshuah - tinha uma linha mestra, uma espinha dorsal que era a história de Jesus em si e como não havia intenção de modificar a “sinopse original”, digamos assim, fui criando o roteiro à partir de cada cena que ia desenvolvendo, ou seja, do início até o fim do roteiro que gerou quase quinhentas páginas de quadrinhos,  tudo foi criado à partir de cada bloco, cada sequência, isso ao longo de treze anos que foi o tempo que levei para produzir toda a trilogia. Ou seja, muita coisa, ou arrisco a dizer que quase que em sua totalidade das coisas pensadas para o último livro, Onde tudo está, lá atrás, enquanto trabalha no roteiro e desenhos simultaneamente de Assim em cima assim embaixo, o primeiro livro, não haviam sido pensadas. Foram acontecendo no decorrer da criação do texto e arte da terceira parte. Particularmente acho essa experiência de criação muito interessante e desafiadora, porém, não é uma regra na minha forma de escrever roteiros. Claro que esse processo funciona comigo porque sou o autor do texto e da arte, então a criação simultânea torna-se um interessante processo.
           Alguns outros trabalhos meus como Questão de Karma (desenhado pelo Alexandre Santos), Histórias do Clube da Esquina, a minissérie Depois da meia-noite e Cadernos de Viagem, para citar alguns, tiveram seus processos muito semelhantes e mais tradicionais, digamos assim, ou seja, escrevi o roteiro na íntegra, da primeira página à última e aí depois fui trabalhar nos desenhos. Meu mais recente roteiro que breve pretendo começar os seus desenhos, As tentações de Santo Antão, também trabalhei dentro deste processo tradicional, embora algo no conceito foi repensado bem posteriormente e curiosamente não altera nada do texto, mas sim da concepção visual. Experiências fantásticas.
           Enfim, toda essa apresentação na verdade é para falar de O gran circo Orgasmático, segunda revista da série da Tianinha, lançada em fevereiro. Nessa nova aventura da loira, ela ainda está no Nepal (confira as postagens anteriores, onde explico sobre essa nova fase da personagem), porém pretende sair do país para conhecer o resto do mundo. Sem dinheiro para esse salto, busca um velho amigo residente em Katmandu, capital do país, para pedir um auxílio, que lhe é negado devido a antigas rusgas, a má fama da Tianinha, ainda a precede. Nesse caminho, a loira encontra Thelonius Blasco, misteriosa figura, dono do tal Gran Circo Orgasmático do título. Convidada a trabalhar no respectivo circo, Tianinha descobre que se trata de um show que propõe uma liberação sexual da plateia e dos artistas, através da inalação de um gás alucinógeno que mistura entre outras coisas hormônios femininos e masculinos. Apesar deste aparente espetáculo de interação demasiada entre público e as figuras que comandam o espetáculo, jovens, homens e mulheres, todos sensuais e muitos dispostos ao sexo, Tianinha desconfia que toda essa parafernália sexual nada mais é que um subterfúgio para de certa forma alimentar Thelonius Blasco, talvez, um tipo de vampiro sexual. Porém, como fora convidada a trabalhar no circo pelo próprio, ela resolve comprar a briga.
           Quando foi pensado inicialmente, este roteiro, apresentava algumas ideias, como Thelonius ser um tipo de antagonista da Tianinha, para essa e futuras aventuras. Mas a proposta desta série é justamente não ter um fio condutor, ou seja, o que foi pensado para o primeiro número, não é necessariamente o que se seguiu para o segundo (embora sim, há ligações entre as edições), então devo confessar que a essa altura já não posso garantir para vocês que Thelonius irá continuar a ser simplesmente um antagonista, acredito que há um campo maior e mais interessante a ser explorado. Os roteiros das revistas da Tianinha também são escritos da forma tradicional, ou seja, escrevo da primeira à última página e depois vou para prancheta desenhar, porém, assim como a personagem, quando abandona o templo encravado numa montanha do Nepal para seguir o rumo de seu destino sem saber ao certo o que virá pela frente, venho trabalhando assim seus roteiros. Fechei a história da segunda edição, que não se completa (olha o spoiler aí!!), porém, sem saber ao certo que rumo essa mesma história tomará na terceira edição e nem mesmo se irá ter seu desfecho. Claro que muita coisa vai somando a essa experiência de criação e uma delas é saber da reação dos leitores a cada edição. Se loira Tianinha não sabe do seu futuro, experenciando a cada edição suas aventuras, o mesmo posso lhes dizer deste criador aqui. E isso é bom demais.
Nesta nova fase da personagem, alguns velhos hábitos não existem mais
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3 de março de 2018

SUBINDO O OLIMPO TROPICAL (final)


             Em uma das inúmeras, milhares de conversas que tive com o André Diniz ao longos dos anos em nossa longeva amizade, uma ocasião, nesse período que começávamos a trabalhar em Olimpo Tropical, mais especificamente eu, desenvolvendo os estudos dos personagens, falávamos do interesse em comum em trabalhar com outras possibilidades de quadrinhos, no que se refere ao cair no lugar
Capa da edição portuguesa lançada pela Polvo Edições
comum de criar histórias violentas, tanto conceitualmente quanto visualmente, para nós, o momento que cada um vinha passando com renovações pessoais, era esboçar novos caminhos e principalmente novas possibilidades no campo da criatividade. Resumo: esta coisa não nos interessava mais. Porém, o paradoxo estava estabelecido. Com um modo de pensar sobre o trabalho, sobre as coisas que se queria e não fazer pela frente, com uma história justamente falando sobre o violento universo do tráfego na favela? Para o André, estava muito claro, que era algo que precisava contar e, não se tratava diretamente de uma história de violência. Violência por violência. Isso em conversas posteriores, sobre o roteiro em si, foi muito conversado entre nós. 
            Naquele período, dois mil e quatorze, havia terminado Yeshuah – onde tudo está, terceiro livro da trilogia Yeshuah e que fora, uma profunda experiência pessoal e artística que obviamente promovera profundas modificações na minha forma de pensar quadrinhos, especificamente falando. Vale adiantar para vocês que Olimpo Tropical era para ter sido meu primeiro trabalho pós encerramento da trilogia Yeshuah. Não acabou acontecendo. Contrato e publicação já pré-definidas com a editora Polvo de Lisboa/Portugal, algo realmente bloqueou meu processo de criação desta hq. Algo impediu que eu mergulhasse nesse profundo mar que era conceber visualmente o roteiro do André. O pré-julgamento cristão de nós ocidentais, impedia num primeiríssimo momento um mais aprofundado entendimento deste roteiro. Por aí, vale dizer, ou melhor confessar que a coisa realmente não prosseguiu, embora claro, os trabalhos de quadrinização já vinham acontecendo, mas num processo lentíssimo e, nesse tempo acabei lançando Dedos Mágicos, Questão de Karma e Cadernos de Viagem. É claro, que conhecedor da infindável qualidade de narrador de histórias que o André tem e, principalmente um talento de parir personagens demasiadamente comuns, corriqueiros e riquíssimos em suas personalidades e psicologias a serem estudadas (estudiosos dos quadrinhos atentem a isso!), muito me incomodava o fato de não assumir os trabalhos com fervor e disposição desta hq, até porque o meu parceiro e velho e querido amigo esperava isso de mim. 
            Um fato raro onde me arrisco a dizer que provavelmente seja a primeira e única vez que tenha feito até o momento, reli o roteiro umas quatro vezes. Li sequências espaçadas, enfim, fui os poucos percebendo qual era o discurso, as metáforas, os simbolismos que estavam ocultos nos personagens, em seus sentimentos, no cenário em si. Muita coisa acredito que puro entendimento meu e claro, isso é que valeu para que mais que virar o ilustrador do roteiro, eu virasse realmente um coautor, que é assim que tem que ser.
             Não quero me estender em minhas percepções deste roteiro e seus sutis momentos, às vezes fortes, às vezes delicados. Isso é fundamental que seja deixado e principalmente permitido para cada leitor. Um trabalho riquíssimo do André. Quando comentei anteriormente da questão do pré-julgamento, justamente me vi caindo na obviedade de querer escrever ou desenhar roteiros onde o discurso pacífico vinda direto como uma bandeira tremulando, pouco percebendo que as coisas podem vir às vezes muito mais fortes do que as outras explicitadas. Um velho criador como eu, não percebendo essa lei, num primeiro momento, porém, atento para aprender. Uma aula e um aprendizado que me fez mergulhar então, como queria, profundamente na narrativa visual de Olimpo Tropical. O resultado foi mais que feliz para mim, para o André, para os leitores. A obra vem seguindo, desde o seu lançamento, no final de dois mil e dezessete durante o Comic Con Experience, uma história muito feliz, tanto em Portugal, onde foi publicada inicialmente, quanto aqui e com certeza, pelos caminhos que for seguir no futuro. 
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Delírio, medo e tormento na mente de Biúca, o protagonista de "Olimpo Tropical"