Sou daltônico. Da categoria dos que confunde, troca muitas cores: verde, marrom, azul, rosa, cinza… O caso de ilustradores, desenhistas terem essa deficiência, se é que posso cometer o abuso de chamar disso, não é tão incomum no meio das artes e mais especificamente das hq’s. Um exemplo disso é britânico John Byrne, grande mestre da nona arte, responsável por grandes clássicos da Marvel. O fato é que ao longo de minha carreira nos quadrinhos, especificamente falando, nunca me preocupei com a questão das cores nos meus desenhos. Primeiramente porque durante muitos anos em que tive parceria com o artista Omar Viñole no Estúdio Banda Desenhada, essa responsabilidade, a colorização, cabia a ele e, diga-se de passagem, magnificamente bem. Embora conversássemos bastante sobre a paleta de cores a ser usada em determinada história, ambientando, dando o clima, sempre expunha minhas intenções, porém deixando a realização e como chegar nessa paleta de cores desejada a ele. E esse método se estendeu posteriormente a outros coloristas com quem trabalhei como Flávio Soares (Iracema) e Thaynan Lana ( O vampiro, Aventureiros do Faz de Conta).
Porém em meu mais recente trabalho lançado, A prisioneira, com roteiro do mestre R.F. Lucchetti, para coleção Escafandro da editora Ultimato do Bacon, resolvi mudar um pouco o foco, digamos assim. Já havia colorizado outros quadrinhos meus como Os faroleiros e outros contos de Monteiro Lobato e Navio Negreiro e outros cantos de Castro Alves, ambos lançados pela Editora do Brasil, porém nesses casos a colorização basicamente funcionou como o elemento a que se propunha. Em A prisioneira, a ideia de pensar uma cor e executá-la d’uma maneira própria veio justamente após a leitura do conto do Lucchetti, um mistério que vai do começo ao fim brincando com as expectativas do leitor. Como sou um profundo admirador do cinema europeu B dos anos 60 e 70, assim como do cinema brasileiro desse mesmo período e venho criando um universo estético em minhas hq’s baseado nesse clima cinematográfico(futuramente falarei disso aqui), resolvi que a cor teria uma menção dos clássicos filmes de suspense italianos desse mesmo período, o gênero giallo, tão popularmente difundido por cineastas como Mario Bava, Lucio Fulci e Dario Argento, esse último responsável, talvez, por um clássico absoluto e mais conhecido desse gênero, Suspíria. A ideia de trabalhar com cores fortes, quase caindo no
monocromático em alguns momentos e, principalmente sem tanta preocupação com uma lógica de cores, explico, azul - céu, marrom - tom de pele, tronco de árvore, verde-mata… compreenderam? Tudo isso veio formatado e deliciosamente aceito para esse trabalho, o que definitivamente trouxe luz aos meus quadrinhos, me proporcionando curiosamente a enxergar uma cor pessoal aos meus desenhos, e que me pareceu ter sido aprovado pelos leitores.
Claro não me considero de forma alguma um colorista, comparando a tantos craques das cores que se tem por aí, incluindo muitos brasileiros, porém, posso me considerar que dou cor aos meus desenhos e que creio conseguir fundir a ideia: a estética pensada (a conversa dos anos 60/70 que voltarei a falar reiterando), meu tipo de desenho e história, quer escrita por mim e por esses grandes parceiros.
Quem se interessou por A prisioneira, é só ir no site da editora Ultimato do Bacon