10 de outubro de 2010

O TOTINHA QUE NÃO ERA TOTINHA

Sou morador do bairro da Pompéia há muitos anos. Muitos. E adoro aqui, embora devo dizer que este bairro já teve tempos mais calmos e de menos prédios. Mudanças inevitáveis para uma grande cidade.
O bairro é popularmente conhecido pelas artes e pela música. Aqui na minha rua mesmo mora um músico cubano e uma das delícias é passar algumas tardes ouvindo-o ensaiar com outros músicos. Acreditem, som de primeira.
Berço do rock paulistano também: Mutantes, Made in Brazil, Rádio Taxi, Tutti-Frutti, Rita Lee, Lee Marcucci. Enfim, mais um tanto de figuras fundamentais outras nem tanto.
O Totinha é uma das figuras ímpares e não tão fundamentais à princípio, que mora por aqui. Parece algo paradoxal, mas é por aí mesmo, acreditem. Esse cidadão de seus sessenta anos acredito (nunca perguntei sua idade), possui uma "banca de jornais" no corredor de sua casa, uma residência simplês mas razoavelmente grande. Especialidade da "banca do Totinha": muié pelada. Edições antigas da Playboy, Private. Sexy e outras que não me recordo.
-Ô, você precisa ir lá dar uma olhada nas novidades. Tem cada uma!
Dizia Totinha para mim quando nos encontrávamos pelas ruas da Pompéia, mais especificamente ali pelas ruas Miranda de Azevedo, Raul Pompéia, Barão do Bananal ou Cotoxó.
Um detalhe curioso é que Totinha é uma figura que vive a reclamar das coisas e contar casos de discussões que tivera com sua irmã ou alguma pessoa. Totinha é daquelas pessoas que procura dar veracidade, digamos assim, quando conta alguma dessas discussões. A veracidade é tamanha que quem passa na rua e vê ele conversando, tem a impressão que está acontecendo uma discussão ali. Entenderam? Sim e dá para perceber algumas situações chatas que passei. Mas tudo bem.
Um outro detalhe curioso é que o Totinha é fanho e tem um problema de dicção, trocando "p's" e "t's" entre outras palavras. Confesso que na maioria das vezes quando me encontro com ele ou tenho uma visita sua aqui no meu estúdio, 90% de sua conversa não consigo entender, limitando-me à responder:
-Ah, é verdade mesmo! Ou -É, você tá certo mesmo!
E quando percebo que ele está contando aqueles casos em que discutiu com alguém por alguma razão que óbviamente também não entendi, limito a algumas conclusões chaves:
-É foda, né ?!
-Ah, é complicado mesmo!
Há algum tempo atrás, início da noite, lá apareceu Totinha aqui para um  bate-papo e contar suas novidades e lá no meio de nosso papo, soltei uma das minhas frases prontas:
-Tá certo, Totinha.
E aí que para meu espanto, ele vira para mim, seríssimo e diz:
-Por que está me chamando de Totinha? Lembrem-se, fanho e com problemas de dicção, mas aí consegui entender, óbvio.
-Ué, Totinha não é seu apelido, rapaz?
-Tá louco, meu, nunca! Tirando seu RG velho da carteira e mostrando-me. Meu nome é Antonio... o sobrenome, me desculpem, não me recordo.
-Mas eu sempre te chamei de Totinha e você nunca falou nada!
-Quê?! Não, nunca me chamaram assim. Ih, "totê tá toido"!
Bem, à partir daquele dia então nunca mais chamei o Totinha de Totinha. Acredito que ou eu, durante esses anos todos tenha confundido seu nome com apelido mais seus problemas de dicção ou o Totinha (não consigo pensar que o seu apelido não exista) esteja esclerosando.
Mas enfim, ainda nesse nosso último encontro, ele antes de ir embora disse sua frase clássica,
referindo-se à sua "banca de jornais":
-Ô, você precisa ir lá dar uma olhada nas novidades. Tem cada uma!




2 comentários:

Unknown disse...

MaGAvilha!

Gilberto Queiroz disse...

MaGavilha ao quadrado! Bela crônica, Laudo.
Ótima semana,