Nas minhas últimas postagens, tenho comentado sobre a grande influência que a estética dos anos 60 e 70 vem tendo nos meus quadrinhos, principalmente no visual, mas não só a estética, como também uma reinterpretação de algumas ideias e conceitos, histórias e personagens. E, refletindo melhor, isso não é de hoje. Se pensarmos, lá atrás, já em 1995, eu já vinha, de certa forma, cultivando isso quando lancei a adaptação do filme “À meia-noite levarei sua alma”, do José Mojica Marins, o popularíssimo Zé do Caixão. Bem, eis que, no final do ano passado ou início deste, não me recordo bem agora, veio uma deliciosa e inusitada proposta dos editores independentes Marcio Sno e Paulo Kobielski: participar de uma coletânea em que, juntamente com outros artistas dos quadrinhos, iria se dar uma leitura para canções clássicas do cantor e compositor Odair José. Como disse, uma deliciosa e inusitada proposta, prontamente aceita.
Cresci nos anos 70. Entre tantas outras coisas (gibis, cinema, televisão), ouvia
muito rádio com minha mãe. E, vale lembrar que não existia naquela época essa
coisa de rádio AM e FM como posteriormente aconteceu; era tudo uma coisa só. Lá
ouvi muita música realmente popular, e antológicos radialistas como Haroldo
de Andrade e Barros de Alencar. Até mesmo o mitológico Silvio
Santos teve seu programa diário. E o desfile de cantores era infinito: Roberto
Carlos (que meu pai era fã absoluto), Agnaldo Timóteo, Antônio
Marcos, Paulo Sérgio, Benito Di Paula, Wanderléa, Rosemary,
Claudia Barroso, Waldick Soriano, entre muitos, muitos. E tinha Odair
José, que de certa maneira me chamava a atenção pelo seu visual, um pouco
diferente daqueles galãs cantores (como eram chamados na época): cabeludo,
muito magro, um olhar distante, sério, e, principalmente, cantando coisas que,
então, para um menino de 12/13 anos, soavam estranhas. "Eu vou tirar
você desse lugar": que lugar era esse? "Para de tomar a
pílula?": que pílula? para quê? Vale salientar que falo de meio dos
anos 70, e só aí existe uma diferença muito grande de um menino daquela época
para hoje.
Retornando então: a proposta para participação nessa revista, que se chamaria "Gibi Proibido" (referência a outra clássica canção de Odair, "Revista Proibida"), a ideia para mim seria dar uma leitura justamente para um outro clássico absoluto, "Eu vou tirar você
desse lugar": a história do cara que fala para uma garota de programa que trabalha em uma casa de prostituição, ao qual se apaixonou perdidamente, que irá levá-la daquele lugar onde ela trabalha para que ambos construam uma vida de amor pleno. A HQ, então, teria um outro campo de visão, que seria da garota ao qual o personagem da canção e do quadrinho faz a promessa, aguardando, sonhando então com esse dia e a dura consequência dessa realidade.
Trabalho lançado. Prontinho para vocês lerem e conhecerem. O gibi traz ainda
Bira Dantas, Germana Viana, Kico Garcia e Kris Zullo,
grandes artistas dos quadrinhos também trazendo suas interpretações. A revista
você encontra no meu site.
Uma honra, uma delícia, e mais uma concretização para uma linha de pensar e
fazer quadrinhos que vem se estabelecendo em minha cabeça.
Ah, sim, em novembro fizemos um lançamento aqui em São Paulo da revista, com
a presença minha, do Kris Zullo, Germana Viana e do editor Marcio Sno, além,
óbvio, do próprio Odair... e num determinado momento foi dado pelo próprio um spoiler
de algo que virá para 2026. Quem esteve presente pode saber, quem não, é
aguardar.
Odair José com o editor Marcio Sno, os desenhistas Kris Zullo, Germana Viana e eu.

